VIOLÊNCIA DOMÉSTICA?



(Se sofreste recentemente algum episódio de violência doméstica, é melhor não leres este texto, pelo menos não agora).




Nós nos conhecemos, e parecia um conto de fadas ouvir tantas coisas boas e tantos elogios.
Fomos nos aproximando, não queria acreditar que estava a conhecer o gajo dos meus sonhos.

Discutíamos algumas ideias, ele era um pouco contraditório, mas ele não era como todos.
Via-me um pouco perdida, não sabia bem quando ele ia concordar com os meus pontos de vista.

Era muito bom, conhecer alguém decisivo e maduro o suficiente, para me guiar e mostrar o mundo.
Aos poucos, fomos coleccionando momentos incríveis que valiam por 3 anos de convivência, mas tive sempre cuidado com os meus modos.

Gritar faz parte, eu é que sou muito confusa, medrosa, sem experiência e não sei como funciona tudo.
Ele me explicou isto 3 vezes, já deveria saber que é assim a forma correta e deveria me considerar sortuda. Tinha um homem ao meu lado que iria me proteger de todos os males do mundo.
Errei mais vezes, não podia. Estávamos prestes a morar juntos.

Era uma bênção poder contar com quem sabe de tudo e os meus sonhos meti de lado ou lá no fundo.
Tinha prioridades, pensava no plural e deveria ser assim, pelo nosso bem e pelo nosso futuro.
Não havia motivos para brigas, não havia traições, eu não percebia nada quando fazia algo errado e ele simulava um murro.

O medo de falar algo sem sentido era enorme, nada mais fazia sentido e eu tinha me encolhido.
 De uma gigante a uma minhoca.
Não me reconhecia, parecia forte, mas era farsa. Não sabia onde ia, ligava sempre para ele saber dos meus passos...Faz parte do nosso pacto: Ficar juntos até que a morte nos separe!
Dependia do sim dele, mas acreditava que de abusivo isto não tinha nada...Estávamos a preparar para o nosso futuro, em tudo deve haver cedências...Bom, pelo menos da minha parte.

Ele empurrou-me mas está tudo bem.
Deu-me uma bofetada e eu não contei a ninguém.
Persigui-me na rua e eu disse que ia voltar, afinal era o meu destino.
Ele protestou bem alto, mudei a roupa e deixei de acreditar em mim. Vivi anos e na altura sentia que nada na vida tinha aprendido. Nada valia.

Ele isolou-me, fiz-me de despercebida e acreditei que as minhas amigas já não existiam e muito menos para alguma coisa valiam.
Tomei decisões tendo em conta o que achava o senhor da razão. Me encolhi e ninguém percebia os meus motivos. Eu me perdi e ninguém notava que queria fugir.

Perdi todo o sentido, a minha criação que eu considerava divina tinha caído por terra.
Vivia e não vivia, era quase que invisível. Perdia e não perdia, nada nas minhas mãos fazia sentido.

As coisas melhoraram...Prometo!

Casamos.

30 minutos de sorrisos e o resto do dia ficava marcado na minha pele.
30 dias de casados pareciam 30 anos a sofrer.
Ninguém acreditava em mim, aparentemente ele era perfeito.
 Reclamavam que eu tinha que explorar e afinar este diamante bruto e sem jeito.

Rapazes serão sempre rapazes...
Teve muito do que quis, a falha foi dos pais e eu estava lá para corrigir.

Rapazes serão sempre rapazes e eu assim o quis, só que ao murro no meu ventre o meu rapaz não resistiu. Tinha 5 meses de vida e já percebia o inferno que o esperava cá fora. Não resistiu porque não quis. E eu não me apercebi que desde o início isto estava errado e não valia a pena insistir.

Eu não me apercebi que os empurrões não eram normais, mas o meu Eu do passado sempre soube que não. Eu não me apercebi que as bofetadas não eram normais, mas a minha alma sempre soube que me estava a ferir cada vez que aceitava este mal para mim.

Recebi ameaças, recebi ultimatos.

Vi a minha vida a voar quase que por um triz. Fugir não era fácil mas fazia todo o santo sentido. Ficar não era mais opção para quem amava a vida. Quis viver e contar que durante muito tempo tive de sobreviver sorrindo.

Me espancaram e sorri.
Eu perdi mas tive que avançar.
Eu me perdi e tive de me encontrar.
Eu estava só e tive que levantar.
Escolhi a vida e tive que por ela lutar.



Navváb A. Danso






IMPORTANTE:

Este texto foi criado por mim com o objectivo de consciencializar os meus leitores com base em alguma exposição directa e que pode ser considerada insensível.
Se de alguma forma te identificaste com este texto e reconheceste a atitude do teu (ou da tua) parceiro (a), gostaria de te informar que não estás só! Existem pessoas que trabalham todos os dias para te acolher e ajudar, existem amigos que precisam saber e existe uma coragem que precisas ter. Não te acanhes, violência verbal é o primeiro passo para a física, uma vez que a física já é praticada, estás a poucos passos de perder a tua vida. Por favor, procura ajuda. Existem pessoas neste mundo que te amam, existem pessoas neste mundo que te querem bem, existem pessoas neste mundo que precisam de ti. Deixa as pessoas certas cuidarem de ti! Contacta a APAV e em caso de emergência, liga sem pensar duas vezes para a polícia (NÚMEROS DE EMERGÊNCIA: Portugal - 112; Cabo Verde - 135).



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