COLORISMO



De maneira fácil e rápida,
Eu te quero pela tua cor um pouco pálida,
Na minha vista nunca alcancei tanta mistura que me acalma,
Uma mistura do bem e do mal fez um meio termo ideal
Mesmo que seja preta,
Ao menos que seja um bocado mais pálida
Tem privilégios e maioria houve a fala


Nasci e cresci em um "mundo" gigante, dentro da minha casa havia tudo o que qualquer um procurava conhecer, a branca, o preto, os mestiços. Do Líbano ao Ghana, fizemos uma pausa na Guiné-Bissau, não falo dos meus passos, mas sim do sangue de quem me gerou, que corre nas suas veias e que nas minhas também sem temor. Nunca tive dúvidas da minha origem, nunca tive problemas com a minha identidade, nunca foi problema reconhecer a minha africanidade.

Nunca tive problemas, mas convivi com quem tinha. Nasci em um país onde pessoas estão perdidas, não percebi até ouvir na escola que eu teria de afirmar se afinal ele era o meu pai, ou se afinal ela era europeia e deveras a minha mãe.

Há cerca de um ano, fiz uma apresentação em um evento, ouvi afinal que o meu projeto, estava mal e nem fiz certo. Disseram que era Mulata Aly e não A Preta Aly. Sorri, engoli e segui, nunca tive problemas com isso.

No meu país, alguns amigos meus achavam inválido aquilo que sempre quis. Lutar para reivindicar o preto dentro da identidade que está cada vez mais "bonita", branca, pálida..."bonita"
Poucos foram aqueles que apoiaram, criei um evento para falar de identidade, fracassei com o tempo porque ninguém quis seguir aquela ideia, pedi que continuassem afinal não estou e não consigo dar continuidade…Até hoje não entendo o medo e a falta de atenção na nossa realidade.

Quanto mais escuro pior:

Não aparece, não tem pele, não escurece mais? É negro e velho.
Não cabe e nem merece caber, não é representador e nem merece o saber.
Corpo inválido, corpo explorado, corpo invadido, corpo negado.
Vi às claras, meu pai era alvo, para eles a nossa ligação não podia ser real, afinal, como foi possível tal? Não há representatividade, o racismo toca e é expelido pela boca sem medo nem nada.
Não há quem salve, é verdadeiro e existe maldade.
Na minha terra é tudo mandjaco.
Tens algum reconhecimento social, mas acredita que a tua série vai ter final em um momento crucial.



Quanto mais claro melhor:

Dá para ser ajeitada, consegue-se chegar a um ponto médio, não sei se me entendes.
Dá para deixar ainda mais claro, damos um jeito afinal já está infestado, queremos o teu corpo a bem, pareces mais connosco.
Sofres menos com o direto, lutas mais com o indireto, ouves coisas e ficas quieto, não sei se me entendes mas é forte, e um veneno na certa.

Corpos negros são selecionados, os menos negros são apreciados, aqui entra a parte crucial, o teu empenho tem de ser imortal!

Cabral. Não me canso de mencionar. Cabral.
Elites, elites são importantes e acredita em mim que sei do que falo.

Pega na tua oportunidade e mata cada qual. Cabral usou uma das armas mais poderosas de todo o império colonial. Para desmantelá-lo usou o conhecimento…O conhecimento que gerou oportunidade e todas as coisas que leste no jornal! O conhecimento que é válido para os do lado de lá, mas que os matou e que os deixou sem voltas a dar!

Sei perfeitamente que este privilégio é real, vivo ele e tenho o exemplo do contrário e do quanto isto é vital…Combinar experiências para não morrer e salvar quem esteja connosco e precise de uma mão e de umas realidades.

Peguei na puta da consciência e transformei-me no que quis. Tornei-me naquela que desafia o termo preta para o bem da comunidade, a que emancipa a preta mesmo sendo mulata!
Peguei no privilégio e juntei o conhecimento para levar a cabo a luta.
Peguei no privilégio para chegar lá frente e levar mais gente.
Pequei no privilégio para me aproveitar da burrice do inimigo.
Peguei no privilégio para elevar aqueles que representam a cor que me gerou, sempre me amou e esteve comigo.
Peguei no privilégio porque nunca ninguém o quis, falaram mal dele e hoje estou aqui. Revelei o meu segredo? Talvez sim! Mas a luta continua, nunca me senti perdida porque sempre tive dentro de mim tudo o que precisei para conhecer o mundo e o meu destino. Represento quem eu amo, quem eu sou e de onde vim.

Agora peço que estendas este pensamento, aproveita desta reflexão, estabelece bem o teu guião, só não venhas com conversas de que tudo isto é em vão.


Navvab A. Danso


Comentários

  1. Olá Navvab,

    Ontem conheci o teu canal e adivinha! esbarrei-me logo com o video "Cabo-Verdianos não são africanos?"
    Achei o título muito, mas muito sugestivo mesmo.
    A primeira impressão foi: o que ela vai dizer sobre isso?
    A segunda: como ela tem coragem de assumir tal coisa sendo cabo-verdiana?

    Enfim, pré julgamentos a parte, amei o vídeo. Sempre esperei ver alguém na própria pele a abordar tal assunto.
    Antes de mais dizer que sou angolano.
    Tenho um amigo cabo-verdiano, e várias vezes conversamos sobre o mesmo assunto e muitas mais coisas relacionadas, inclusive se ele visse o teu video concordaria em género número e grau. Porém a pesar de todas as conversas que já tivemos uma questão em particular nunca me ficou esclarecida de todo, apesar de eu já ter algumas ilações a cerca da mesma, ainda assim precisava falar com alguém que realmente estivesse dentro do assunto.

    Prefiro não a colocar aqui porque acho não ser o fórum de todo adequado, contudo peço-te caso tenhas tempo e paciência de discutir a questão, que me ajudes a ter mais pontos de vista sobre a mesma.

    Por agora vou deixar os meus contactos caso me dês a honra de falar
    Instagram: elicelestial
    Facebook: Elias Celestino
    elycelestial19@hotmail.com

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    1. Olá Elias,
      Primeiramente peço imensa desculpa por estar a responder só hoje! Eu não sabia que tinha de ativar as notificações da plataforma para poder receber alertas dos comentários...Achei ridículo não estar a ser notificada e fico triste em ver tantos comentários interessantes e só poder responder hoje, meses depois! Terei todo o gosto em trocar ideias contigo sobre o assunto, podes enviar a tua questão para afrikanaescreve@gmail.com
      Um abraço!

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