PRECISAMOS VOLTAR
Eu entendo que este assunto seja delicado, complicado e
evitado, mas a verdade é que temos mesmo que tocar nele, não podemos tapar o
sol com peneira nenhuma, não podemos fingir que nada se passa, não podemos
seguir sem antes refletir sobre este facto, o seu impacto e a sua disposição na nossa vida e existência
neste mundo.
Já perguntei inúmeras vezes aos meus amigos e aos meus
amigos virtuais qual o motivo pela qual descartam a possibilidade de voltar
para Cabo Verde… As respostas são quase sempre as mesmas e sinceramente sempre
entendo, mas mesmo assim, isto não me impede de rebater.
“Não há condições”…”Não há trabalho”…”Não há
oportunidades”…”O meu estilo de vida já não se adequa à realidade da minha
terra natal”…”Não acho que estou preparado para ir”…”Preciso ganhar
experiência”…”Posso ir, mas não tenciono ficar muito tempo”…”Ficar está fora de
planos, já tenho feita a minha vida cá”.
Não sou tão ignorante a ponto de não mencionar questões
políticas que falham muito quando o assunto é “seduzir” os cérebros de volta
para Cabo Verde, mas vou atrever a deixar este debate para um próximo texto,
porque não dá para abordar tudo de uma vez só, e é certo que para mim, a nossa
mudança de pensamento relativamente ao “voltar”, é essencial e é primário antes
de falarmos de questões políticas propriamente ditas…Aliás, não é político
falar da nossa mudança de pensamento e dos nossos posicionamentos?
Um dos maiores erros que nós jovens cometemos quando
partimos da nossa terra:
Nos acomodamos aqui e nos distanciamos da nossa realidade…
Ou porque realmente a nossa vida mudou para melhor, ou
porque simplesmente temos outros planos e não vale “de nada” tentar concretizá-los
na nossa terra, afinal, não há condições.
Um dos maiores erros que nós jovens cometemos é investir
força mental e física em algo que não nos representa e não tem grande benefício
para os nossos. Sim, devemos bater na mesma tecla, precisamos de mais união
entre nós, precisamos de mais representatividade, precisamos representar,
precisamos voltar, precisamos saber recuar quando a proposta é boa, mas o
espírito morre e a criatividade também.
Vou dar um nome fictício à minha amiga…Consideremos Marina. Ela
terminou o curso dos sonhos que queria tanto, planeou milhões de coisas, tinha na
sua lista de prioridades, voltar para a sua terra. Marina ouviu muitas
coisas que desencorajam qualquer jovem pronto para um desafio…Ela ouviu que
estava louca, que estava a estragar a sua vida e a abrir mão de oportunidades.
Marina sempre teve o meu respeito e ganhou mais quando afirmou que se não tiver
a oportunidade que tanto sonha ter, irá criar!
Não, não é fácil, não caminhamos com a hipocrisia, mas criar
oportunidade é o que mais interessa quando o assunto é mover mentes e
inspirá-las a voltarem!
É importante esclarecer um facto…Quando eu falo de voltar,
pode ser voltar para qualquer país Africano que consideras por bem, o melhor
destino para ti e para o teu progresso profissional e pessoal. Não precisa ser
necessariamente o país em que nasceste, mas para mim é essencial ser um
regresso ao teu continente.
Temos tantas opções, mas temos medo de escolher, temos tantos
desafios, mas temos medo de encará-los porque acreditamos que não vale a pena, é
perigoso, é arriscado, coloca tudo a perder, é completamente insano e
representa um desperdício de oportunidade. Engraçado como nos fizeram acreditar na incapacidade do nosso continente e da nossa gente, que hoje somos nós que afirmamos em alto e bom tom tudo isto, e ainda acrescentamos que estamos convictos desta "realidade".
Tratamos a Europa e o Ocidente no geral como o destino
glorioso, como se não tivesse nada melhor, e como se fosse proibido abandonar
tudo o que se encontra dentro deste mundo. Já vi jovens a desperdiçarem os seus
sonhos e a perderem oportunidades só para estarem cá, só para poderem colocar a
localização nas fotos das suas redes sociais e filmarem pequenos ricos locais que
sabemos que não fazem parte da realidade deles no dia a dia. Vejo jovens a
suarem feio e a engolirem muito só para quando voltarem para as suas terras, de férias, afirmarem que vivem fora e que na verdade vivem bem. Se me permitam, já vi
génios a olharem para a restauração como a solução das suas vidas e a perderem
objectivos, sonhos, momentos e oportunidades.
Consigo identificar crânios que não se sentiram suficientemente bons para liderarem e avançarem com os seus projectos, porque foram desencorajados e inferiorizados cá.
Não vejo jovens com ambições gigantescas quando o assunto é
o nosso continente e somos nós que devemos mudar esta realidade e este pensamento. Não vejo os inúmeros jovens formados em energias renováveis
a criarem projetos e a tentarem entrar em empresas e organizações Africanas…Vejo
jovens recém-formados loucos por um rendimento de 1500 euros mensais, que aceitam
se encaixar em ambientes tóxicos, racistas, xenófobos e ridículos.
Não vejo os meus amigos a idealizarem uma volta para o nosso
grande continente, vejo-me em uma realidade onde claramente estou a perder mentes
geniais que poderiam construir planos fenomenais, a fugirem para o frio e a
humilhação.
Ninguém quer estudar, investigar e analisar a nossa história…Perdemos
tempo a dar informações e a servir de peluches para a construção de uma
história que não nos pertence e nem nunca dará ênfase à nossa existência.
É mais bonito estar-se em Paris do que em Accra…Rende mais
likes a torre Eiffel do que a estátua de Kwame Nkrumah. Dá mais jeito saber do
lado de cá do que o sofrimento do lado de lá que é nosso. É um grande
investimento dividir casa para o resto da vida com desconhecidos, trabalhar das
9 às 18 e ainda ver o dinheiro a ser entregue como se fosse um favor, do que
trabalhar arduamente pelo nosso continente, no nosso continente, onde sabemos bem
que o custo de vida compensa tendo em conta aquilo que recebemos e que o ambiente é completamente diferente.
Hoje em dia não admiro nada comentários e afirmações...Cada dia estou mais convicta de que se continuarmos a agir como a história foi contada e está a ser contada, perderemos todo e qualquer respeito, pouca ou qualquer oportunidade.
Dá mais jeito ficar, sofrer, morrer sufocado, nunca evoluir
e sempre ser taxado de estrangeiro, do que voltar, florescer, trabalhar,
progredir e olhar para a nossa vida com orgulho de sermos os filhos que
finalmente voltaram...Os corajosos que finalmente aceitaram dar continuidade à missão.
Não há nada que seja verdadeiramente bom que não exija sacrifícios…Os
primeiros, os segundos, os terceiros da geração “Return” vão sofrer…Mas eu
prefiro sofrer e lutar onde os meus antepassados derramaram sangue, do que
ficar e temer uma raiz que nunca irá sair de mim…E o mais importante, uma raiz
que precisa de mim, precisa de nós.
Navvab A. Danso
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